quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Funcho em dia de Epifania



Assinala-se hoje o Dia de Reis, ou, se preferirmos utilizar a designação rigorosa da tradição cristã, o Dia da Epifania. O dia em que, 12 dias depois do seu nascimento, é anunciada a indiscutível natureza divina de Jesus, materializada na adoração que os três reis magos oriundos de Oriente lhe tinham vindo fazer. Epifania é isso mesmo: de acordo com a etimologia da palavra significa "simplesmente" "o grande acontecimento".

Na pratica este dia, cuja comemoração se faz hoje de forma muito ténue, sobretudo desde que entre nós deixou de fazer parte da lista de feriados católicos (em 1969), encerra formalmente as duas Festas da quadra: A do Natal e a da Epifania do Senhor. 

E como se encerram hoje as Festas,  nada melhor que aproveitar o dia para, não sem algum humor, voltar a publicar sobre algumas das plantas mais emblemáticas da nossa flora cujo interesse e significado também se foi perdendo  ao ponto de chegarem hoje quase ao esboço.

A abrir esta série de pequenos textos, que publicaremos durante os dias perfeitos de Janeiro, começamos por uma cujas qualidades fazem dela uma planta a ter sempre ao pé de tão essencial que é: O Funcho. Não pretenderá competir competir com os pergaminhos do incenso e da mirra, mas se tivesse sido oferecido não ficava nada mal na fotografia.

De forma muito resumida o funcho é simplesmente uma planta perfeita da qual tudo se aproveita e nada faz mal. Pertencendo à família das apiáceas, de que já escrevemos aqui, o foeniculum vulgare
faz parte das nossas memórias colectivas e do património etno-botânico de um sem número de localidades e populações. Só de terras que lhe tomaram o nome, os dedos das mãos não chegam, desde a conhecida cidade do Funchal até à funcheira, funchalinho ou funchosa.

A propria planta assume aliás diferentes designações, sendo também conhecida por fiolho, erva-doce, funcho-hortense, funcho-de-florença, entre outras, o que frequentemente é gerador de confusão.

A sua utilização quer como planta medicinal quer como planta comestível está amplamente descrita e integra já inúmeras publicações dedicadas à flora silvestre. Os ramos juvenis podem ser consumidos em sopas. Aromatizam também saladas e grelhados e as suas sementes adoçam as mais diversas doçarias. Medicinalmente o chá de funcho está indicado para aligeirar digestões, problemas respiratórios e ,se for o caso, ajudar na produção de leite materno. O sabor fortemente anizado das suas sementes, devido aos compostos quimicos que as constituem, metol e fenol, explicam igualmente que os seus extractos façam parte da maior parte dos rebuçados para a tosse.

Mas se os argumentos acima não fossem já suficientes para se querer ter sempre um funcho por perto, juntamos mais quatro: 1) germina com extrema e generosa facilidade numa semana; 2) é uma planta vivaz que cabe em qualquer vaso, canto do jardim ou da horta; 3) É muito pouco exigente de cuidados e requer pouca rega e 4) contribui para a biodiversidade do jardim ao ser uma das plantas preferidas dos insectos polinizadores.

Terminamos por fim fazendo referência à  relativa confusão que existe entre esta espécie e outras que ou lhe são familiares ou lhe tomam nomes próximos.

Existe efectivamente uma outra "erva-doce" que não é autóctone de Portugal mas sim dos países do Mediterrâneo Oriental e Médio Oriente e que ao longo dos séculos foi sendo disseminada em hortas e jardins. Trata-se do anis, ou pimpinella anisum. Planta que também pertence à família das apiáceas e cujo sabor forte e adocicado é inconfundível.

A confusão decorre da facilidade com que a expressão "erva-doce" é utilizada, pois existe igualmente uma variedade do Foeniculum vulgare  var. Dulce.

O funcho-florentino ou "erva-doce de cabeça" que produz um proeminente caule bolboso consumido como legume e que hoje já se encontra com facilidade em muitos supermercados pertence, tanto quanto conseguimos apurar, à espécies Foeniculum vulgare var Azoricum.

Já o  aneto, também conhecido por funcho-de-cheiro, sendo uma planta da mesma família das anteriores, igualmente aromática e com diversas utilizações culinárias, é de uma espécie diferente ( Anethum graveolens), e possui um ciclo de vida anual.

De notar ainda que o anis acima referido nada tem a ver com a especiaria anis-estrelado, hoje muito em voga, Illicium verum, uma especiaria cultivada no Sul da China e noutras regiões tropicais.

Em cima:  inflorescência de funcho (Foeniculum vulgare) e Inflorescência de anis (Pimpinella anisum); Em baixo:  Funcho-florentino (Foeniculum vulgare var Azoricum); Aneto (Anethum graveolens) e cápsulas/sementes de anis-estrelado (Illicium verum)

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