Nos dias de hoje não há projecto que subsista sem uma vertente
comercial e são incontáveis os esforços para associar os mais diversos produtos às diferentes datas comemorativas que o calendário nos vai marcando. Nós não fugimos muito à regra e se o Dia dos namorados era um
excelente argumento para os enamorados oferecerem sementes de murta (ou
outra!porque não) o Carnaval é também uma óptima desculpa para falarmos e
promovermos outras espécies. E este ano, voltamos a uma da nossas plantas
preferidas: a arruda.
A associação é um pouco-forçada, reconhecemos, mas tem uma razão
de ser. A arruda, à semelhança do Carnaval, tem reconhecida carga
simbólica e é uma planta mistica para muitos, indispensável para
afastar o mau-ollhado ou a inveja, sendo por outros ainda conhecida com a
erva-das-bruxas.
É bem provável que nos actuais festejos de Carnaval se cruzem
reminiscências de diversas tradições com significados e antiguidades diferentes.
Desde as festas em honra de Dionisio na Grécia, a Baco na Roma Antiga passando
pelos rituais de fertilidade das primeiras comunidades agrárias, o mais
provável é todas elas terem contribuido para a actual configuração dass festas
de "Adeus à Carne" (carnem levarem), que hoje comemoramos pelo segundo dia.
O enfoque de que mais gostamos é possivelmente o que os mascarados
de Lazarim (Lamego) e os caretos de Podence (Bragança) mantêm ainda hoje vivo e
que, não há muitos anos marcava o Entrudo na grande parte das nossas
comunidades rurais, longe dos actuais desfiles e corsos inspirados nas
tradições originadas em Paris no século XIX e que têm hoje no Brasil um expoente.
Eram os rituais de celebração do fim do Inverno, da preparação da
Primavera e das novas colheitas, em que aos jovens mascarados de figuras
diabólicas todos os excessos e tropelias eram permitidas, porque o início
de um novo ciclo de fecundidade se aproximava e era preciso afastar o que de
velho ainda subsistia.
Essas festas agrárias foram entretanto confinadas pela Igreja aos três
dias anteriores ao início da quaresma, a qual se inicia sempre na quarta-feira
de cinzas, 47 dias antes do Dia de Páscoa. Como o Dia de Páscoa é uma
celebração móvel (determinada todos os anos pela mesma regra: primeiro
Domingo após a primeira lua-cheia que se observar depois do equinócio de Primavera, o qual no hemisfério Norte ocorre a 21 de Março. Este ano a Páscoa será pois a 5 de Abril), temos
que também os três dias de Carnaval são móveis.
E há que aproveitar, pois o Entrudo (entroito, em latim, entrada), são os três dias reservados aos excessos que podem anteceder a entrada nos 40 dias da quaresma - Um período em que todos os crentes são
convidados à frugalidade e reflexão, condição essencial
para celebrar condignamente o sofrimento de Cristo que se relembra na Semana-Santa.
Mas a época que agora se inicia tem ainda mais relações com as plantas que nos rodeiam. Quarta-feira de cinzas, dia18 de Fevereiro, assinala como diziamos o início da Quaresma. E é por ser de cinzas que em muitas localidades de Portugal é ainda tradição queimar os ramos utilizados no dia de Ramos do ano anterior (de oliveira, rosmaninho, alecrim, etc). E com as cinzas, humedecidas com àgua benta, o celebrante marca nos fiéis o sinal da cruz relembrando o quão efémeros somos: "lembra-te que és pó e ao pó voltarás".
Por falar em Lazarim, acabei de vir de lá.
ResponderEliminarConsidero-me um privilegiado...
Cumprimentos.
E é mesmo Rafael! Os dois que lá fui ficaram-me na memoria! Mas mesmo assim fico com inveja! Um abraço
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