quinta-feira, 31 de agosto de 2017

A triste e insustentável eucaliptização do Litoral

Agosto de 2017 - margens da Lagoa de Óbidos. O novo eucaliptal,em baixo, contíguo ao bosque mediterrânico, em cima, foi igualmente eaté há bem pouco tempo um frondoso bosque .


Depois de alguns dias na costa vicentina e de regresso ao trabalho, partilhamos hoje, último dia do mês de Agosto, um post sobre um dos temas centrais que marcam irremediavelmente  a actualidade tal foi a violência dos incêndios que em 2 meses reduziram a cinzas vastas áreas do centro do país.

Fazêmo-lo neste último dia de Agosto, que  já tem cheiro de Outono, porque gostaríamos de reservar Setembro para aquilo que ele tem de melhor: preparar a nova época de sementeiras que se aproxima: Outubro e Novembro são os meses em que se decide o que se quer ver ver florir na Primavera de 2018 e para isso contamos acrescentar mais espécies aos nossos catálogos e apresentar novas ideias para quem quiser que este seja, aqui e agora, o momento de semear flora autóctone. Na horta, na varanda, no quintal, no jardim ou, porque não, no bosque que um dia se queira legar.

Porém, à parte os vitais e essenciais aspectos comerciais deste projecto - uma nano-empresa, diríamos, vitais para a sua sobrevivência económica, há questões centrais de cidadania às quais, mesmo visando nós a rentabilidade e o lucro, é impossível ficar indiferente.

E a questão central para nós, como já referimos em momentos anteriores, prende-se com a imperiosa urgência em conseguirmos, enquanto povo, implementarmos politicas de ordenamento florestal e territorial consistentes e com uma visão de futuro sustentável. Não pretendemos esgrimir argumentos - são diversos os especialistas, bem mais capazes do que nós, que nos últimos meses têm apontado as soluções. As quais, de forma alguma, estão acolhidas na reforma florestal, recentemente aprovada e sob-pressão, para descargo de consciências de alguns.

Dessas medidas agora aprovadas, que não conhecemos em profundidade, há todavia um aspecto que, pelo que temos lido nos jornais, nos deixa no mínimo perplexos: A diminuição da área de eucalipto das regiões agora ardidas terá por contrapartida o licenciamento de novas plantações, em progressiva menor área, no litoral do país.

Não percebendo nós muito bem como é que tal será implementado e fiscalizado e não tendo bem presente onde acaba o litoral de um pais com o máximo de 200 Km de largura, não deixa de ser muito estranho o rumo traçado.

Para começar porque não se percebe como serão recuperados os solos já esgotados do interior. Quem irá financiar essa recuperação? Como se faz? Depois porque o dito litoral está já hoje hiper-eucaliptado. Monchique, Lousã, Caramulo, Minho e por ai acima até à Corunha já foram entregues aos métodos associados à espécie. Significará que se irá licenciar a eucaliptização partes do litoral Alentejano (ainda mais)?) da região Oeste(ainda mais)? E como se fará a atribuição desse jackpot que é hoje poder plantar eucaliptos? Todos os proprietários poderão plantar ou só alguns? E se forem só alguns, de que forma serão ressarcidos os restantes que não acederem a essa lotaria???

Será a ideia substituir o Pinhal litoral por um Eucaliptal litoral à semelhança do que foi promovido no Pinhal Interior? `Será desanexar, com a facilidade que todos nós sabemos ser desporto nacional, solos agrícolas das bacias do Lis, do Baixo Mondego e do Baixo Vouga, onde a produtividade ainda é mais estonteante? Não sabemos e desconfiamos que ninguém saiba.

Na região Oeste em particular, onde estamos sedeados e que conhecemos bem, o eucalipto já avançou pelas areias litorais substituindo o pinheiro em muitos povoamentos a norte da Nazaré e até às matas nacionais. Entre Caldas-da-Rainha e Torres Vedras sucedem-se os novos povoamentos os quais  até nas margens da lagoa de Óbidos - um ecossistema que deveria ser reserva natural, no qual se gastam milhões de Euros em dragagens de desassoreamento, outrora povoada de fulgurantes bosques mediterrânicos - se plantam eucaliptos à pressa em pleno mês de Agosto, tal qual como noutras zonas de Leiria conforme relatado pela imprensa local (AQUI), procurando salvaguardar as futuras restrições da lei.

As imagens acima, das margens de um dos braços da Lagoa de Óbidos, dispensam quaisquer descrições tão evidentes são as diferenças de beleza, biodiversidade e respeito pelo solo. A manhosa técnica de arrotear tudo e qualquer arbusto para que só os eucaliptos vinguem, destruindo irremediavelmente a estrutura do solo e para que se a comunicação social exiba provas de que os eucaliptais são limpos pelos zelosos proprietários e logo ardem menos (pudera !) são suficientemente explicitas do que é que está em questão.

A ser executado é para nós óbvio que este é um caminho "mais do mesmo" e que  não acautela uma gestão estratégica do território. Que no futuro acarretará aos vindouros pesadas facturas.

Se na nossa opinião a monocultura de eucalipto deveria ser desde já fortemente limitada, admitimos que não é viável acabar com ela no imediato (embora nos pareça também óbvio que isso acabará por acontecer um dia, seja por obsolescência seja pelas alterações climáticas. E esse é um cenário sobre o qual deveríamos estar a pensar: o que fazer a um imenso território que daqui a algumas décadas vai estar ecologicamente destruído e sem qualquer proveito económico).

Nesta perspectiva, sendo insustentável que todo o litoral seja um imenso eucaliptal, resulta claro que, por uma questão de igualdade de condições de exercício dos proprietários florestais, a cultura do eucalipto só pode ser possível dentro de regras bem definidas e claras que não excluam povoamentos de outras espécies que assegurem uma função ecológica.

Fazer o que nos últimos 100 anos não fizemos, será complexo e demorado. Mas não será por falta de propostas em cima da mesa que não se fará o que tem de ser feito. Das muitas propostas, destacamos duas que nos parecem urgentes e de elementar bom senso:

A constituição de entidades responsáveis por áreas territoriais que, com escala, permitam uma floresta ordenada e com um mosaico de diferentes povoamentos, como defendido por Pedro Bingre do Amaral, é, também no litoral, uma evolução para qual deveremos caminhar o quanto antes. 

Encontrar formas de remuneramos colectivamente os serviços de ecossistema prestados por uma floresta diversificada e bem ordenada , desviando o que se gasta hoje, por exemplo, no combate aos incêndios em acções de prevenção e ordenamento, como defende o Arquitecto Paisagista Henrique Pereira do Santos, parece-nos igualmente outra proposta muito razoável e que permitirá suprir uma falha onde o livre-mercado-iniciativa não funciona e produz resultados que prejudicam a nossa sociedade no seu todo. 

Outras haverá, em diferentes vertentes, desde mentais, jurídicas e operacionais, mas sem estas, ou outras similares com igual alcance, que proporcionem uma efectiva administração do território com a escala necessária, dificilmente estaremos a caminhar no bom sentido.



sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Floresta Comum - Há sete anos a criar bosques



O Projecto Floresta-Comum, liderado pela Quercus em parceria com o ICNF e a UTAD, dedica-se desde 2010 a criar bosques autóctones. Desde o seu início já foram plantadas perto de 650.000 árvores de 60 espécies nativas diferentes em cerca de 168 concelhos do nosso país.

A nova fase de candidaturas a plantas do projecto Floresta Comum está aberta desde 28 de Julho e prolonga-se até 29 de Setembro, podendo  candidatar-se as autarquias ou outras entidades públicas bem comos órgãos gestores de baldios. As plantas estarão disponíveis para a próxima época de (re)arborização, de novembro de 2017 a fevereiro de 2018.

Sabendo nós que muitas autarquias são cada vez mais sensíveis ás iniciativas da dita sociedade civil esta é uma excelente oportunidade para que grupos de cidadãos promovam localmente a criação de espaços mais bio-diversos.
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Será uma gota no imenso mar da dita "floresta" de produção!?! Muito possivelmente. Mas há mares que se fazem de muitas gotas!

Mais informações sobre a fase de candidaturas AQUI.

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Flores de Verão - Grande Lisimaquia e outras sugestões


Um dos desafios quando se jardina com flora autóctone é o de como florir o jardim numa estação em que há menos espécies em flor e os tons mais secos e castanhos tomam conta do que nos rodeia. Aprender a gostar de tons castanhos e aceitar que nas latitudes mediterrânicas esta é a época de maior stress para a flora, é cada vez mais importante e meio caminho andado para ter jardins mais ecológicos e sustentáveis.

Claro que nem todos gostam e as buganvilias e as  lantanas, exóticas amplamente disseminadas no nosso país , são a salvação de quem quer ter um Agosto sempre florido. Não temos nada contra, e se não se abusar nos arranjos multi-color, qualquer uma fica bem como apontamento.

Todavia, e por incrível que pareça a muitos, a verdade é que a nossa flora também tem espécies a florir com exuberância em Julho e Agosto. São é pouco conhecidas, apesar de estarem à vista de todos nós se formos observando a paisagem com olhos de ver.

Uma delas e das nossas preferidas é a Salgueirinha, Lythrum salicaria, sobre a qual escrevemos AQUI há cerca de dois anos. A sua floração prolongada e abundante fazem dela uma planta essencial para quem pretender florir zonas encharcadas de lagos ou solos mais húmidos.

Porém a abundância de espécies com enorme potencial ornamental de que dispomos, especialmente adaptadas a solos húmidos, é tal que nos escusamos a indagar porque é que no nosso país ainda só estão confinadas aos sítios onde ocorrem naturalmente. 

A Grande-Lisimaquia, de amarelos intensos, Lysimachia vulgaris, será porventura a mais injustiçada. Mas as outras, na foto seguindo o sentido dos ponteiros do relógio, não o são menos: O Trevo-cervino (Eupatorium cannabinum), a Salgueirinha (já referida acima, Lythrum salicaria), os Malmequeres -bravos (Leucanthemum lacustre?) os Epilóbios (Epilobium hirsutum) e o Ruibarbo-dos-pobres (Thalictrum speciosissimum) são apenas mais 5 espécies que facilmente e sem grandes riscos nos atrevemos a sugerir a quem puder tê-las por perto! 

E, acreditem, não esgotam as possibilidades! Facilmente se juntam mais 10 especies igualmente ornamentais que ajudarão a garantir um Verão sempre florido sem ter de recorrer a espécies exóticas!

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Sobral Interior

(vista da aldeia Ferrarias de S. Joao, Penela, onde os sobreiros travaram de forma bem evidente o incêndio de Junho)


Há pouco mais de um mês Pedrogão Grande; há 15 dias nos distritos da Guarda e Vila Real, hoje em Mação, Proença, Oleiros, Nisa, Vila Velha de Rodão. Só um chegaria para arrepiarmos caminho, mas, aparentemente, tudo indica que o país vai ter de continuar a arder por muitos e bons anos até que nós, ou outros que venham a seguir  nós, encarem o problema de frente e ponham mãos à obra que terá de ser feita.

E o que terá de ser feito, como em quase tudo o resto, depende mais de uma visão politica de longo (longuíssimo) prazo do que de estudos científicos parcelares, diplomas legislativos avulsos e entidades da administração publica desconectadas entre si.

Ora, na nossa perspectiva, só há uma visão digna do nome: Ousar de uma vez por todas revolucionar o ordenamento de amplas áreas do nosso território do centro do país e das suas extensões florestais.

Pedro Bingre do Amaral, professor da Escola Agrária de Coimbra, para nós um dos que de forma mais consistente tem reflectido nos problemas da nossa floresta, publicou no seu perfil de FB, AQUI, poucos dias após os incêndios de Pedrogão Grande, a sua leitura do que poderá ser a região agora fustigada pelos incêndios e que para alguns é ainda conhecida como Pinhal Interior. Nas suas palavras poderá ser um grande SOBRAL INTERIOR. Como escrevia: 

"O centro de Portugal pode vir a recobrir-se com dezenas de milhar de hectares de montado de sobro, assim haja vontade política e cívica para isso. As vantagens serão várias: é mais fácil debelar o fogo num montado do que numa floresta densa; o sobreiro recupera melhor após o incêndio que os eucaliptos e os pinheiros; a cortiça é um produto com boa saída nos mercados internacionais, havendo pouca concorrência de outros países; o montado é particularmente favorável à biodiversidade, à cinegética, à produção de cogumelos e espargos, e ao ecoturismo."

Poderá ser um sobral, um cercal, ou um carvalhal, ou um misto de tudo isso e onde até pinheiros e eucaliptos caberão certamente, mas, independentemente, dos contornos de como isso pode ser feito, essa é a única visão de futuro sustentado que esta região precisa.

Ao fim de dois mil anos a desflorestar e 100 a florestar erradamente, seria de Homem um povo assumir o desafio de cuidar da terra que o alimentou durante gerações. E abdicar de vez da mania de que estes pobres solos têm ainda a obrigação, em pleno séc. XXI, de gerar rentabilidades alucinadas, cuja fasquia é marcada de forma distorçida pela indústria da celulose. Rentabilidades que nunca, em momento algum da nossa historia, a floresta teve. 

É empresa para os próximos 100 anos, e como tal pressupõe um amplo consenso na nossa sociedade. A questão, como é evidente, está em saber se alguma vez a conseguiremos por em prática. Se temos a vontade, a energia, a liderança e os recursos para o efeito. 

Muitos dirão que tal é impossível de concretizar. Talvez. Mas sem sonho, sem visão e sem rasgo nunca nada que valesse a pena se fez. São inúmeros os exemplos de sociedades que caminharam para um colapso anunciado porque no seu seio não conseguiram mobilizar as mudanças estruturais que se impunham e estavam à vista de todos. E casos há em que todas as partes seguiram seguras para o abismo, com a desculpa de que estavam a executar na perfeição o papel que lhe estava determinado.

Para nós, e felizmente para muitos outros, esta é a visão que se impõe e para a qual deveríamos mobilizar os nossos recursos económicos, técnicos e científicos. Ao serviço de uma visão de futuro, que é essa a ordem natural das coisas! Pode nao ser agora, mas sê-lo-á de certeza absoluta um dia.

Nem que seja daqui a alguns anos, depois de a industria da celulose colapsar por obsolescência!


sexta-feira, 14 de julho de 2017

Edição Especial: Girassois de Verão!




Mas quem é que nunca se deixou maravilhar por um campo de girassois!?!? Em Portugal, sobretudo nos campos do Alentejo, é difícil não ficar deslumbrado com as extensões a perder de vista de girassois geometricamente perfilados com milhões de infloresçências a moverem-se de forma sincronizadas e perfeita em torno do Sol.

São uma das nossas imagens de marca  e estão indissociavelmente ligados às memórias de muitos dos nossos Verões. Daí que mesmo não sendo uma espécie nativa do nosso país é, como outras, uma espécie que já ganhou direitos de cidadania no nosso imaginário.

E não é por falta de outras plantas autóctones, que também florescem no Verão e que por aí existem debaixo dos nossos olhos, à espera de ser vistas! Mas esta espécie, originária do continente americano, e com tantas qualidades ao ponto de hoje ser uma importante cultura em todo o mundo, é demasiado emblemática para que não lhe prestemos a devida homenagem.

 Faz por isso todo o sentido termos uma edição especial de sementes de girassol! Num pacote com um design também ele especial, juntámos cerca de 50 sementes prontas a serem semeadas e a florir em qualquer varanda, terraço ou jardim. A variedade é de pequeno porte - cerca de um metro de altura e tem uma floração abundante e demorada! Acresce a isto que é de fácil germinação e, com alguns cuidados, cresce muito rapidamente!

A partir deste fim de semana e até ao fim do Verão estarão disponíveis apenas em algumas lojas parceiras das Sementes de Portugal: Na Vida Portuguesa em Lisboa e Porto; Na Casa da Bli, em Lagos,  na Casa das Portas, em Tavira e nas lojas Bairro Arte, de Porto e Lisboa.

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Tempo de colher



À semelhança de anos anteriores o Verão é para nós a estação das colheitas por excelência e como tal uma das alturas de mais trabalho no ano. Daqui até Setembro a nossa principal preocupação será a de preparar a nova época de sementeiras que se iniciará nos fins de Setembro/inícios de Outubro.

Estamos a renovar os nossos stocks e é já certo que iremos acrescentar novas espécies, seja no nosso catálogo geral de sementes seja no nosso catálogo de pacotes que conta actualmente com 50 espécies mas que nós pretendemos fazer crescer até ás 60.

O Verão não é a melhor altura para semear, mas sendo o período de férias por excelência, é o tempo de descansar e de começar a pensar que sementes gostaríamos de germinar no próximo Outono. De Norte a Sul de Portugal as sementes das espécies mais emblemáticas da nossa flora estão disponíveis nas lojas de que mais gostamos no nosso país.

Por fim e sendo certo que os máximos de floração já ocorreram na Primavera, convém não ignorar que durante o Verão ainda há espécies autóctones em floração. Em menor número, é certo, mas de tonalidades inconfundíveis. Como os campos de azul-celeste de chicória, ou almeirão, que nos acompanha de meados de Junho até meados de Agosto, e que é uma das nossas preferidas como escrevemos AQUI.

Mas há mais espécies de encher o olho que nas próximas semanas iremos partilhar aqui. Até lá, boas férias, ou se preferirem, o mesmo é dizer, boas colheitas!


terça-feira, 20 de junho de 2017

Solstício de Verão 2017


Costumamos e gostamos de assinalar equinócios e solstícios. O de Verão, particularmente, por ser o início da estação que geralmente associamos aos dias longos e às férias. Por ser época de santos populares, festas e romarias. Para nós ainda, por ser a época de colheitas e por, apesar de ser a época mais seca, ainda se vislumbrarem aqui e ali muitas das flores silvestres às quais atribuímos valor, seja ele ornamental ou outro.

Este ano porém, o solstício, que ocorrerá esta madrugada pelas 5h24m, de acordo com o AOL, será marcado pelos muitos fogos que ainda lavram na região centro do país  e que, numa dimensão trágica inimaginável, conduziram à morte 64 pessoas.

Não poderá ser um solstício de celebração e será seguramente e para sempre um dos Verões de pior memória para nós. Lembrar os que perderam a vida em Pedrogão Grande este Verão será a imagem que nos vai acompanhar nos próximos 3 meses.

Mas se não há nada que os possa trazer de volta à vida, que a sua trágica morte possa motivar o sobressalto que todos nós, enquanto sociedade, lhes devemos para que tragédias idênticas não se repitam.

Um sobressalto que nos faça perceber de uma vez por todas que, longe de sermos os melhores dos melhores, falhamos muito e em muita coisa enquanto povo. E em toda a linha em matéria de ordenamento e gestão do nosso território, onde devemos competir nos últimos lugares da tabela com o Haiti ou a ilha da Páscoa.

Aqui chegados dispensamos-nos a juntar mais bitaites sobre o diagnóstico. Pelo menos desde 2003, ano em que ardeu Oleiros, que as causas profundas estão identificadas pelos mais diversos especialistas. O prof. Jorge Paiva, O  Arq. Ribeiro Teles, o Prof. Nuno Gomes da Silva, Luís Alves, Pedro Bingre do Amaral e tantos, tantos  outros,  já explicaram de forma detalhada que o nosso território não suporta as extensões de monoculturas de eucalipto e pinheiro que as fileiras industriais pretendem; Que a solução passa pela constituição de unidades de gestão minimamente dimensionadas que, dotadas de recursos e capacidade efectiva de acção, promovam povoamentos  mistos com outras espécies, nomeadamente autóctones; que, se necessário for, o Estado deverá expropriar amplas parcelas de território.

Embora nem tudo se possa assacar ao Estado - quantos de nós, que nos emocionamos no conforto dos nossos sofás, não tem uma parcela de terra ao abandono!? - É a este que, no conjunto das lideranças politicas e da administração pública, cabe a responsabilidade de gerir o território e os diferentes actores que nele se movimentam, nomeadamente: industrias, populações e autarquias.

E foi aí que o nosso Estado, lideres políticos eleitos+administração pública, central e local, falhou total e redondamente nos últimos 40 anos. Não são necessárias demissões deste governo em particular, porque todos os anteriores foram incompetentes. Mas também não podemos aceitar que hoje apenas se nos ofereçam de mão vazias, voz embargada, olhos húmidos e desorientados para daqui a menos de dois meses rejubilarem de alegria a abraçar despudoradamente turistas nas praias do Algarve.

Porém, quando morrem estupidamente 64 cidadãos, não é mais possível continuar a empurrar com a barriga e a assobiar para o lado. Nem insistir em fórmulas e estruturas que já provaram não serem capazes. O que precisamos de saber é tão simples como o que é que de novo se está disposto a fazer para repensar seriamente o ordenamento do território e da nossa floresta. Sem hipocrisias. Se for mais do mesmo dos últimos 15 anos, mais livros brancos, mais prós e contras da Fatima Campos Ferreira, para, depois, no fresquinho dos gabinetes de Lisboa, se concentrarem em mais medidas de apoio à produtividade da fileira de celulose e contratos milionários para o combate às chamas, o melhor será mesmo assumirem de uma vez por todas a sua incapacidade e que amplas áreas do país estão subtraídas à nossa soberania e concessionadas à lei da indústria mais forte.

E, se for esse o caso, se for impossível, se a República não tem nem o dinheiro nem a capacidade, a única coisa que nos restará fazer, se pretendemos manter ainda alguma dignidade, será então evacuar permanentemente as poucas populações que por lá ainda agonizam. Dar-lhe novas oportunidades de vida digna no litoral e, por misericórdia, evitar que morram carbonizadas.

E as televisões portuguesas que descubram outros espectáculos degradantes para entreter as massas. Nem imaginação, nem drones lhes faltam,  tantas são as vezes que por estes dias tanto nos têm lembrado até à náusea os filmes "Jogos da Fome",  provando que também aqui a realidade ultrapassa com muita facilidade e largamente a ficção.